Frase do Dia

  • "Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão"

terça-feira, 30 de maio de 2023

Do outro lado da montanha


Aos vizinhos quero-os do outro lado da montanha. 

Que venham ao meu encontro quando os chamo, quando quero, se quiser. 
Para um almoço animado, um copo de tinto e eventualmente uma conversa transcendente que nos traga a sensação de que gostamos de viver.
Os vizinhos que venham para se sentirem bem, desejados num momento de partilha, sedentos da gargalhada e embriaguez fáceis. 

No tempo morto: os vizinhos nas suas casas. Eu na minha. 
Nos tempos escolhidos: encontros ocasionais, opcionais, leves. 

Que as tardes de acolhimento sejam só bem passadas. Nos tragam alegrias, histórias para contar e até sonhos ou projectos para nos reencontrarmos em viagens alucinantes mas breves.

O que quero são vizinhos de ocasião, que não me penetrem a alma mas tão somente o estado de espírito.
Quero boas companhias que não me conheçam de verdade.
Quero diálogos entusiastas, sem promessas duradouras.
Quero felicidade em estado puro: passageira.

Não quero o compromisso, a entrega, o conhecimento profundo ou os juramentos eternos.
Não preciso do perdão ou de perdoar.
Não preciso de fazer sofrer nem do sofrimento.
Não preciso de saber o que os move ou paralisa.
Não precisam de saber os meus medos e anseios.
Não farão falta as saudades, as lágrimas ou a desilusão.

Assim serão eternos, os vizinhos do outro lado da montanha.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Num instante


Num instante tudo muda.
Fica escuro.

A tua presença vira ausência.

O que era o dia, a rotina, o toque, desaparece como a leveza do que nunca existiu. 


No negrume, vem uma nuvem que me adormece os sentimentos e a energia.

Fico só. 

Fico só com aquilo que existe para além de ti-aquilo que pensava ser tanto.


Apercebo-me que preencheste muitos dos espaços que nunca deixara ninguém vislumbrar ou ocupar.

Entraste de rompante e criaste raízes profundas sem pedir, com a naturalidade de quem prometeu, sem palavras, ficar.


Hoje, neste instante, saíste sem deixar recado. 

Deixaste-me no silêncio.

No meu íntimo, sempre soube que este dia ia chegar, porque quem como eu nunca abre as portas a ninguém, sabe que nada do que nasce pode durar para sempre. 

É esta a beleza da efemeridade.


No final, julgo estar a sorrir, porque partiste para ser feliz. 

E eu, que fui apenas o lugar de um tempo bem passado, dissipo-me do que fomos e encontro novos horizontes.


É esta a magia do instante: quando a nuvem passa, há muito mais para além do que se via.


quarta-feira, 1 de março de 2017

Saudade crua


Esta é a história da saudade crua. A saudade sem esperança que a cada dia me acompanha nos corredores escuros do pensamento.

Todas as vezes que me encontro comigo num hiato de minutos percorro aqueles três dias de agonia. Vislumbro olhares, volto a sentir o medo, a tristeza. Oiço as vozes que se fizeram música ausente. Pressinto de novo a tua partida e repito sem fim as frases, os movimentos, as decisões.
No longe ainda vejo o carro de vidro percorrer quilómetros sem regresso, sinto nos dedos a terra derramada e reflecte-se na água das minhas lágrimas o teu último suspiro.

Esta é a história da saudade crua. Uma saudade diferente de todas aquelas que vivem à custa dos encontros e reencontros. A saudade crua só existe entre os mortos e os vivos e faz-se altiva, penetrante e dolorosa à custa da  linha intangível que separa este Mundo e o Outro.
Para esta saudade não há remédio, não há ressalva ou ponto de retorno. Só o esquecimento, que o tempo se encarregará de construir, poderá algum dia reconfortar a alma.
Se assim não fosse, se me lembrasse de ti para sempre como hoje me recordo, a saudade do futuro seria tão crua como esta do tempo presente.
Uma saudade triste, vazia e sem a esperança do reencontro.



sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Orla marítima


A orla marítima dissolve os desejos outrora propulsores da nossa força.
Inconsequente, leva para lá do alcance visual aquilo que nos amparou e motivou em noites de tempestade, dias de fome e perdas de fé.
No arraste das ondas revoltas dilui-se ainda a esperança, a curiosidade e o Amor que tanto nos demorou a construir.
Essa água, que em tantas vezes transpareceu a verdade que há em ti e em tantas vezes se fez lágrima das nossa ansiedade, é hoje tão somente o trem de despedida.

As ondas passam e a água arrastada de outros tempos viaja hoje sem destino. No rodopio das correntes desencontradas vai tudo o que conhecemos e fizemos nosso. Vamos-nos. Assim, sem mais nem menos. Sem sabermos se algum dia as ondas mansas regressarão à costa.

domingo, 19 de junho de 2016

Cada vez mais longe de sermos Homens. Cada vez mais perto do que nos distancia


As cartas que nos escrevíamos guardam o pó das alegrias passadas.
Frases infindáveis de desejo, sentimento ou simplesmente histórias que nunca tinham por onde terminar preenchem papeis carcomidos pelo tempo e esquecidos por descuido.

As cartas de hoje não se escrevem.

As nossas partilhas não se fazem mais de crónicas ou versos ansiosos de despontar no outro o irremediável sentimento de saudade e vontade de estar junto.
As nossas partilhas são hoje artifícios, imagens perfeitamente esculpidas e inertes na sua acção. São verdadeiras obras primas: intocáveis, silenciosas, solitárias.

Quanto tempo vamos passar assim?
Quanto tempo conseguimos nós, seres sedentos de contacto, viver nesta alienação?

Dou por mim a pensar que talvez tenhamos chegado a um ponto sem retorno. Talvez a necessidade de ser feliz tenha verdadeiramente sucumbido à necessidade de parecer feliz.

Noutros dias, de maior esperança, penso: não é possível ficar aqui para sempre. O ser Humano não consegue fugir ad eternum aos seus instintos familiares, às suas necessidades mamíferas de afecto. Haverá com certeza um momento em que todos fugiremos desesperados destes artifícios há muito unidos por pontes intransponíveis.
As revoluções sempre chegam, dizem. E eu acredito.
Acredito que quando for a hora de fugir desta bomba relógio de ilusão, acabaremos por regressar aos que nos pertencem. Porque não existe casa, lugar ou realidade melhores, que o coração daqueles que escrevem cartas.

quinta-feira, 3 de março de 2016

Confessemos


Confessemos os nossos pecados e admitamos as nossas fraquezas:
- Somos histórias inacabadas, incapazes de se apagarem ou reescrever. Seres imaculadamente incomparáveis aos enredos penetrantes dos livros que lemos, pela simples necessidade e desejo de finitude.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Claro como água: Estamos sempre a perder tempo quando não estamos a viajar.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Espaço


   Há para lá daquele susurro das memórias uma música e um cheiro que se entranham como a realidade o faz com o tempo presente. 
   Essa melodia e odor sussurrantes não se caracterizam pelos habituais adjectivos da existência, porque tão simplesmente fazem parte de uma outra dimensão onde as forma e os brilho não se acompanham de legenda.
   Tu desconheces os sons, os odores e a própria arquitectura das minhas memórias. 
E eu, igualmente, desconheço os produtos mentais que alimentam as tuas sinestesias. 
Ainda assim, há entre nós um espaço inventado, onde por obra cúmplice divina se modelam novas músicas, novos cheiros e memórias intrigantes que mais não são do que o resultado da fusão do nosso íntimo. 
   Neste espaço inventado que acedemos por portas inusitadas e fugazes reside a tua e a minha paz. 
É o lugar que nos abriga das tempestades do pensamento e nos permite, sem restrições, o exercício do Amor.
   Sempre que precisares desse nosso espaço, não hesites, há sempre lugar na infinitude da invenção...
(A imaginação tem destas coisas).



domingo, 13 de dezembro de 2015

"Trabalha como se tudo dependesse de ti e confia como se tudo dependesse de Deus"
Santo Inácio de Loyola (1491-1556)

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Diz-me


As luzes foscas da tua noite recordam-me o que é sentir o transpirar da agonia na tua ausência.
O som longínquo, perdido entre as chamas das velas do teu altar, lembra-me que o tempo há muito te deu o toque de partida.

Nessa eternidade distante que criaste, no meio de uma multidão tão ausente como tu, lembras-te de mim?
Ainda consegues imaginar o que é sentir reencontros?
Ainda consegues entreter a mente com os sorrisos rasgados que ecoavam nos Mundos que criávamos em brincadeiras?
Diz-me, há quanto tempo deixaste de acreditar na tua imaginação?

Todos os horizontes que vejo lembram-me que existes algures longe de mim.
Mergulhaste há muito nas perdições da vida, como se de um limbo se trata-se. Voltas por breves momentos à superfície onde me encontro e tocas-me ao de leve como dantes.
Se calhar nunca te disse, mas as tuas mãos são como penas na minha pele. Tocam-me suavemente e logo voam para lugares distantes.

Diz-me, algum dia pensaste em escrever-me?
Algum dia pensaste em contar uma história como esta?





sexta-feira, 16 de outubro de 2015

in Cartas para Ti


Naquele rasgo de olhar tão profundamente teu, ainda encontro o sabor a Vida, o mesmo sabor de sempre, o Único.

Contorno-te em todos os traços da tua face, dos teus lábios e das tuas palavras, como sempre o fiz e como sempre irei fazer. Não há cansaço que me impeça de percorrer a cada segundo a imensidão que és, essa força da Natureza, esse espírito selvagem indomável pela minha razão ou pelo meu próprio Amor vagabundo.
E todo o impulso começa diabólico a crescer dentro de mim quando te percorro e quando te penso. Mas Hoje não me detenho. Percorro-te, ouço-te e digo-te adeus, sempre, como se fosse a última vez.
Há muito tempo que já descobri que não sei escrever para ti, saem-me versos toscos de quem reune demasiado sentimento, demasiado fogo para a inutilidade das palavras.
Agora faço o que se faz quando já se viveu na distância: Sinto-te. Mas sinto-te tanto que queria que sentisses os meus vasos a pulsar, o meu coração a bater quando te sinto. É demasiado para as palavras, é demasiado para te dizer o que quer que seja, é demasiado para o que esta vida suporta ver. (Sabes, acredito mesmo que há Amor que a própria vida não aguenta).

Pois bem, Sinto-te. Só isso. A ti e à felicidade plena que existe em mim quando por breves instantes partilhamos um espaço que é de (novo) nosso. 

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Pura física


És só Tu nesse instante em que te lanças ao mar.

As ondas rebentam fortes nas costas imponentes ao vento e o impulso gerado na perseguição da própria paz é maior que o medo que te faria ficar por terra.

Os acenos, ruídos e murmúrios desvanecem-se e só o pensamento da própria integridade física tem lugar.
Sentes a água deslizar pelos dedos das mãos e as pontas dos pés ganham formas conscientes.
A cabeça guarda uma única questão clara que nunca se alastra a metafísicas: Vou conseguir apanha-la?

Tudo isto de tão pouco e tão nítido é tudo o que conta nesse instante.

De repente em pé. Uma fracção mínima ainda que gloriosa do tempo.
Segundos.
Segundos felizes duradouros como horas ou meses de conquistas.
Fracção limpa, curta, preenchida, onde só a mente se dilui num vácuo ténue de unidade com a Natureza. 

Ainda que haja nesta aventura do físico, instantes badalados a sonoridades inconscientes, o hiato vivido foi único e exclusivo de um corpo sedento de si mesmo. 

(Nunca)

"Nunca voltes aos lugares onde foste feliz".. Dizem...
Acrescento...

Salvo se:
- Foste só e queres voltar só;
- Foste só e queres voltar acompanhado.

quarta-feira, 20 de maio de 2015


Pensei que te tinha perdido. 
A ti, essa memória que em tantos momentos recordei no meu silêncio como o aviso mais poderoso e precioso dos últimos tempos.
Mas não, ontem voltaste-me e agarrei-te como se fosse a primeira vez que te recordava. 

A imagem que guardo é nítida, as palavras são simples e o cenário inesquecível:

Estava numa consulta a acompanhar uma das médicas que até hoje me surpreendeu mais pelo seu lado humano, quando a vi.
Era uma mulher alta, demasiado magra para ser saudável, coberta de rugas de sofrimento e uma calvice digna de um tratamento já duradouro de quimio.
A abordagem inicial foi a normal: abri-lhe a porta com um sorriso, disse "buenos días", indiquei-lhe a cadeira e voltei-me a sentar junto da minha tutora.
Pelo que tinha lido da história clínica e pela conversa inicial percebi que a Sra. sofria de uma doença temível (que me arrepiava só de pronunciar o nome), diagnosticada desde há uns meses e em seguimento terapêutico desde então. 
Como quase sempre acontece neste tipo de tratamentos o animo inicial de luta e vontade de vencer estava altamente abalado. Vi inclusive pela cara da médica que o prognóstico não devia ser nada bom, remetendo-se quase sempre a um sorriso amável e receptivo.
Passadas as perguntas inicias de rotina, a doente ganhou subitamente um novo brilho no olhar e  decidiu contar-nos os seus dias depois do último tratamento:

Depois do último tratamento senti-me bastante abalada, demasiado fraca e sem grande ânimo para continuar a fazer a minha vida normal. Sentia-me esgotada.
Dois dias a seguir foi o meu "cumpleaños" e pensei "Joder! Hay que celebrar un día más de vida!". Foi instantânea a reação e não fiz mais nada senão procurar os meus sapatos preferidos. Aqueles que sempre me acompanharam no que mais gosto de fazer: "Bailar". Tirei-os do armário, vesti um vestido lindo "Que guapa estaba" e desci ao piso inferior. 
Tinha-os a todos: a minha família, os meus amigos, música, comida "solo para mirar no para comer", o meu vestido lindo e os meus sapatos. Todos me olharam com receio, porque sabiam muito bem o que tinha sofrido nos últimos dias...Mas soltei o cabelo da peruca, enchi-me de força e dancei. Dancei, dancei e dancei até não poder mais. Não devo ter aguentado mais de 10 minutos, mas dancei. Senti-me viva como há muito já não me era permitido. No fim nem forças tinha para apagar as velas do bolo ou subir as escadas sozinha, mas bolas, que feliz estava com os meus 60 anos cheios de música e dança.   

O olhar que manteve durante todo este relato foi inesquecível. Repleto de um brilho de triunfo, de quem tinha vencido o sofrimento com um pequeno prazer da vida.
A sala de consulta nos minutos subsequentes ganhou uma luz incorruptível e quase que podia jurar que havia um choro uníssono de comoção entre todas.

Já no fim da consulta, despedimo-nos sem promessas de nos voltarmos a ver.
Fechei a porta e voltei-me pensativa para a minha médica que me recebeu com um sorriso.
Deixou que me sentasse ao seu lado, colocou-me a mão no ombro e disse-me:
"Mariana, nunca te olvides de respirar. Nunca te olvides del importante que es vivir e aprovechar lo que tienes"

A vida é demasiado curta para alguns, mas apenas finita para os que já não estão entre nós. 
Enquanto aqui estivermos existimos. 
Enquanto aqui estivermos somos infinitos na nossa essência e no que podemos fazer dela.  

terça-feira, 12 de maio de 2015

Viagem


A viagem não começa quando se percorrem distâncias, mas quando se atravessam as mais profundas barreiras interiores.
A viagem acontece quando acordamos fora do corpo, longe do último lugar onde se pode ter casa, um nenhures inabitável, onde à solidão apenas se opõe o sonho impenetrável de ter partido.

Quem parte treme, quem regressa teme.
E qual a linha ténue que separa este segredo do Sagrado?

Não existe resposta metafísica para a falácia da condição de viajante. Do processo de ida, de ultrapassagem dos limites e do regresso apenas sabemos o óbvio: Recordamos.
Recordamos em filme de memórias nítidas o que fomos, o que tivemos e em playback vislumbramos um desfile de imagens que perdura incessante no nosso Eu do agora.

No íntimo de nós, sabemos que quem se lembra tanto de tudo é porque espera pouco mais da Vida.
No íntimo de nós, sabemos que já só nos resta o medo de sermos hoje, tão somente, o que fomos e tivemos um dia.



sexta-feira, 8 de maio de 2015

Hoje é simples e curto.


Hoje é simples e curto: Aceitar ser Feliz.

A Felicidade é-nos na maioria das vezes vendida como uma propriedade, um estado ou um perfil demasiado difícil de alcançar e suster na longa jornada da Existência Consciente. No entanto mais do que essa inatingibilidade é a Crítica (alheia e própria) a maior responsável por nos apartarmos dessa condição. 
Bem, não nos aceitarem como felizes é mau, mas não nos deixarmos invadir pela nossa própria felicidade é no mínimo decrépito.

Há muito que me dei conta que grande parte do problema reside na educação judaico-cristã que tão solenemente imprime na nossa sociedade a ideia estóica de que a Felicidade deverá, em toda e qualquer circunstância, ser o resultado de um esforço sobre Humano. E com isto não digo que a culpa de não aceitarmos a felicidade é tão somente da educação. Sim, há uma influência major dessa rede humana na forma como pensamos, mas acima de tudo há uma imutável Pide interior que jamais se cansa de nos autopunir por "pularmos a cerca". 
Oponho-me! Oponho-me a esta chacina, a este culto silencioso de não aceitação do que deveria ser Natural no Homem. A felicidade não é um Santo Graal ao alcance de uma minoria santificada, digna e esforçada, tampoco é uma substância facilmente adquirível (diga-se), mas é no mínimo um Bem acessível a todos. 
O tema roça o cliché, verdade, no entanto, se pararmos para pensar... Não passamos nós grande parte do tempo a escolher armas para alcançar a felicidade? E quantas dessas vezes a estratégia foi tão somente destruir os muros de pedra que nos separam dela? 
Poucas, digo-vos, demasiado poucas.

Hoje é simples e curto: Aceitar ser Feliz.
Porque isso não tem mal nenhum, não exige explicações e é tão Bom.
Bolas, é tão Bom. 

sexta-feira, 13 de março de 2015

Há copos que não se esvaziam


Há copos que não se esvaziam.

Copos que geram um compasso de conversas lentas e olhares focados, que nos dissolvem pouco a pouco um no outro, como na primeira vez em que nos descobrimos.
Deixamo-nos ir num gesto de dança imóvel e de uma só vez rodopiamos pensamentos e energizamos ideias, abrimos em salto o coração à vontade que temos de explodir e...explodimos! Sempre.

Explodimos na mesa de uma tasca, com um por de sol de fundo, explodimos sem espaço e sem limite, explodimos onde não podíamos, sem barulho e sem movimento para além dos comportados pelos instintos do diálogo.
Dos destroços que libertámos em todas as direcções construimos as nossas correntes. A ignição da nossa telepatia activa-se pelo olhar e ai estamos despidos, prontos para nos unirmos no que mais de íntimo encontramos em nós: a condição Humana.

Não há maior força de ligação que esta. Uma ligação metafísica que depois de uma explosão nos permite recomeçar lentamente, sem pressas e sem dúvidas, a construir algo tão nosso como o substrato pelo qual queremos caminhar na Eternidade.

Há copos que não se esvaziam, sedes eternas e indestrutíveis que sempre possibilitarão o maior milagre da vida: a entrega inconsequente e desmedida ao Amor.




terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

O fenómeno


O fenómeno do "Continuar a Gostar".

É surpreendente a capacidade que o Homem tem para continuar a Gostar de algo ou de alguém. Não me deixa de impressionar, apesar da maioria tomar como garantido, a forma como o coração nos orienta. E o sentido é único, mesmo estando cada um de nós sujeito a um rodopio de estímulos diários que poderiam facilmente promover a alteração de rota.

A verdade é que as mentes mais racionais explicam este fenómeno à luz de um trabalho diário, incessante e silenciosamente obsessivo. No entanto, tanto a experiência como a observação me têm mostrado que parte deste, advém de elementos exteriores independentes do nosso trabalho, dedicação ou cuidado. 
Injustos, inglórios e demasiado imprevisíveis. São os apelidos que geralmente atribuimos a esses elementos. Concordo. Muitas vezes concordo. Mas neste campo específico, da Arte de Gostar, a verdade é que o encanto do que está por fora do domínio da vontade se sobrevaloriza. Chega a ser mágico o inexplicável que é, dia após dia, experiência após experiência, Continuarmos a Gostar como no primeiro dia em que o fenómeno "rebentou".

Mais do que continuar, na verdadeira acessão da palavra, como quando perseguimos uma linha recta monocórdica, o fenómeno do "Continuar" exerce-se numa sucessão de picos. 
Sentimos na pele dos dias os Altos e Baixos inerentes ao Tempo que inevitavelmente nos toca, mas quando nos olhamos numa perspectiva extracorpórea o que se vislumbra é uma linha activa, que brilhantemente se desenvolve no infinito. 

Que continuemos a deixar e a saber "Continuar a Gostar". 
Mas que seja claro (porque nem sempre se pode fugir ao racional) que os referidos Picos que reluzem a recta são como as transmissões de um electrocardiograma. Inteiramente dependentes de um impulso eléctrico transmitido entre dois pólos. 


quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Caminhos de ferro


Os caminhos de ferro seguem firmes pelas paisagens infinitas de perder de vista. O que vislumbram é tudo o que a vida alegoricamente pode dar: a respiração nos prados verdes, a liberdade nos riachos alagados de cristais, o amor nos casais apaixonados, a perda e o terror nas lágrimas derramadas entre faces de vultos intocáveis.

Passam. Rectos, estóicos, seguros e salvos por uma falsa imunidade carente de exposição aos antigénios vitais.
Contínuo movimento. Paragens obrigatórias. Tudo como previsto nos relatórios de circulação prescritos por entidades alheias.

Mas até eles, espiritualmente amorfos, têm os seus pequenos desvios.
Desvios esses que os sustentam nas pequenas alterações térmicas, subjacentes às variações a que nenhum material, mais ou menos vivo, pode fugir.
No mínimo desvio, que nada mais cumpre que as leis da termodinâmica, eis que se impede o descarrilamento.

Imaginem-se agora os irrequietos de espírito que seguem nos seus próprios veículos.

De que precisarão mais para além das omnipresentes leis da física?
Mais certamente, sempre mais.
E por isso vivem e não somente vislumbram.





segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Interregno

Maldito interregno este que me ocupa e dissimula, que corre como um veneno insólito e entranhado no jogo confiante de que um antídoto eficaz tardará em chegar.

Interregno por ser o período que decorre entre o momento em que me conheci e o futuro que não sabe até onde se irá perder.
Maldito, porque habita corrosivamente nesta nuvem que a nenhum corpo, razão ou destino pertence.

As lutas incessantes preenchem este hiato e trazem-me por vezes ao rosto gargalhadas descabidas e desorientadas, típicas de quem teme e de quem se vê, já em idade adulta, a espreitar a porta da saída do armário.

Sinto o ridículo. 

Tantas e tantas vezes com tantas certezas. Tantos sonhos. Tantas vontades. E de repente uma sensação de vazio incontrolável, uma nebulosidade que não passa com o despertar e que não desaparece com um copo de vinho demasiado cheio.

Onde estou?

Será que a Puta da vida armou-se agora em senhora e quer ser tratada pelo nome? 

É doloroso. Mais ainda, para quem pensa, repensa e volta a cair no erro de pensar.
Conto os dias para o terminar desta tortura que até do sono se alimenta. 

Que desgarro incomensurável de mim.

Que é feito de ti, espírito de alento e desejo?! 
Volta, porque não há maior saudade que aquela que nutrimos por nós mesmos.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Alma gémea


Mesmo com os afastamentos a que a Vida obriga, as almas gémeas sempre fluem no sentido do reencontro. 
É essa a sua natureza, o seu destino e objectivo.
A Magia que une cada um dos átomos de que são formadas, é a responsável por essa debilidade presente na singularidade e apenas restituível no reencontro. 

Dizem...que pode ser que o tempo, a distância ou o medo não me permitam mais o toque, o abraço ou o sentir do cheiro que emana estonteante da tua(minha) alma(gémea). Mas a lucidez, a essência desta ligação impenetrável sempre trarão ao real a possibilidade de encontro na Nossa dimensão.

Vai. Vai e segue-te. Arrisca. 
Podes correr por estradas diferentes, podes sentir calores que nunca o meu frio compreenderá e podes até experimentar na Vida elixires que a minha nunca poderá provar. Mas lembra-te, no fim da noite quando olhares para o céu e para Ti, vais saber que nos podemos encontrar em cada memória. Vais-te lembrar que nunca a nossa Unidade se fará única sem a pluralidade a que as nossas almas obrigam. 

Estou, estarei e estaremos. Para sempre. 

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Um coraçãozinho



A propósito do tema saudades, dei por mim a ter coração do tamanho de formiga.
Não sendo suficiente, a correria de visitas levou-me de coração de formiga a  coração de pulga. 
A pergunta que me faço é se estarei no caminho de ficar com um coração tão pequenino tão pequenino que a única solução será desfazer-me dele!?

Quando estamos longe é verdade que temos tendência a pensar em coisas que outrora nunca tínhamos pensado, é verdade que fazemos coisas que nunca antes tínhamos feito, mas também é verdade que sentimos por vezes na pele (ou abaixo dela) a realidade de uma forma tão intensa como nunca julgámos possível.

Estou bem onde estou, estou feliz por aqui estar e quero ficar por mais tempo. No entanto, no último mês (sobretudo) experimentei este sentir quase álgico e nanico da saudade. Não é uma saudade que me faça chorar, que me faça ficar deprimida ou estagnada, é simplesmente uma saudade que se sente mais no corpo e que me torna mais pequena... Mas mais pequena no sentido literal!

Como creio no que sinto, acabei por me ver ao espelho várias vezes nestas últimas semanas. O dito não se mostrou muito afectado com a minha redução de tamanho, mas, como aqui penso (ainda) mais, arranjei com facilidade duas explicações para a ausência de confirmações:

1. O espelho prefere mostrar o aumento das curvas filiadas à incessante ingesta de tapas e tortilhas;
2. Estou oficialmente enferma. Padeço de Síndrome de anorexia saudadítica, um conjunto de sinais e sintomas cuja etiologia é eminentemente psicogénica (que tão bem se justifica nestes novos tempos).

À parte das explicações pouco engenhosas (e pouco importantes), tenho por certo o meu diagnóstico e as consequentes repercussões no meu tamanho cardíaco. Assim, para que o meu coração não se metamorfose mais na linhagem animal, apelo ao leitor da seguinte forma:

- Se padecer da mesma doença por favor contacte-me - a medicina sempre melhorou com a troca de experiências e opiniões;
- Se pensar em matar uma formiga ou uma pulga tenha em conta que alguém poderá, com a mesma facilidade, fazer o mesmo ao seu coraçãozinho;
- Se pensar em fazer-me uma visita saiba que há relatos de aumento cardíaco nessas situações, no entanto, saiba também que a redução pós-visita pode ser fatal;
- Se nunca experimentou nada parecido e se pouco crê na veracidade destas alterações anatómicas, experimente ir ao Longe um bocadinho e ficar lá à espera - pode ficar surpreendido.

P.S. se este coração que escreve fugir da pulga, prometo dar notícias!





quinta-feira, 13 de novembro de 2014

A janela


As folhas não se movem lá fora, porque não há vento que lhes pegue. Invés disso, cai a chuva sobre a minha grande janela aberta para a montanha já nevada.

Dou-me conta no instante longo do olhar de que o tempo aqui passa e a vida aqui existe. Este é o sítio onde de facto noto que há algo em mim para além do que conhecia.
Descobri um dom? Não sei.
Sou mais feliz aqui? Não sei.

Nas corridas nocturnas saio da casa, à qual já me atrevo a chamar lar, e lanço-me às florestas virgens dos pensamentos que deixei interrompidos numa outra existência. Sou o pássaro, o sonho e a esperança.
Sou nesses momentos de deambulação da alma a personificação da aspiração que já há muito me faltava.

Será...
Da distância?
Da saudade?
Do medo?

Talvez. Talvez sejam essas as razões pelas quais estou mais perto do meu centro.
Mas o que importa? Para quê questionar?
É tempo de viver o tempo no qual me atrevi a perder-me.

sábado, 19 de abril de 2014

Em memória do grande homem e escritor que nos deixou...mais pobres de Humanidade.

"La peor forma de extrañar a alguien es estar sentado a su lado y saber que nunca lo podrás tener."

Gabriel Garcia Marquez

Histórias



Quando as histórias deixam de ter linhas por escrever, os poetas dessas escrituras tornam-se seres inanimados no espaço humano. A missão desses Seres finda e os dias terráqueos acompanham o fim desse ciclo. As manhãs já mais não têm luz e as estrelas não se esteiam no céu nocturno.

A vela do teu adormecer, apagada pelo teu sopro ausente, calou esse meu espírito de poeta. Ele que nesse sopro deixou de acreditar, de ansiar, de espectar e de esperar por qualquer coisa no destino.
Porque o ensinaste Senhor a esperar? Quando a sua espera se faz de outros humanos que não concluem, que se apagam e que se calam em nome de nada.
Aprende, que a espera torna-se este movimento inconclusivo cheio de promessas quebradas e de um vazio de amor que nos destrói por cada segundo a mais.

Por isso, quando te pedia que me contasses uma história, não era em vão. Era por isto, para que o significado de escrever, nas linhas da vida, não fosse tão lábil como essa chama que apagaste num sopro.
Quanto te pedia que me contasses uma história era porque precisava de um outro poeta junto a mim que não me deixasse findar e me acompanhasse num futuro apelidado Esperança.

domingo, 13 de abril de 2014

Alma tua


Alma tua,
Ausente, distante, nublada.

Misteriosa pelo que foi,
Revertida, fraca, amorfa
Pelo que nunca será.

Alma tua,
Que viajou sem destino,
Sem nunca se encontrar.
Perdeu-se,
Sem a força do libertar.

Alma tua,
Que não me entende,
Que lacera e deixa pó estelar.
Um pó de Vida,
Que trarará virtude
A outro universo que não o meu.

Alma tua,
Longínqua, esquecida, fugaz.
Que representa o tempo,
E tudo aquilo que não fui capaz.

Alma tua,
Que de tua nada tem.
Porque bem sabes,
A alma que digo ser tua,
É só a condição do que
me convém.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Aceitar

Aceitar:
O acto de resignação para connosco.

Aceitar é ainda a pedra lacerante do nosso orgulho, da nossa chama.
Porque nada em nós ou no que nos rodeia nos incita à aceitação.

Aceitar o erro, a perda, o desgosto.
Aquilo que nunca me poderás dar
E aquilo que não sei dar a ninguém.

Aceitar, resignar, deixar.
Para quê tanto pó levantado?



segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Há dias definidos

Este senhor descreve tudo e tão bem...


Dias de chocolate e sexo. Dias de doces e suores. Dias a dois, na solidão cheia de um mundo sem par. E tudo se resume ao prazer. Todos os suores merecem amar. Todas as bocas sabem o que é a felicidade. Todos os Homens sabem o que é a felicidade - mas só alguns têm a coragem de a exigir. Em ti, por detrás do pano do beijo, por detrás da força do abraço, por detrás do barulho eterno de um gemido, há toda a coragem de nada mais haver senão tudo. Passar as mãos pelo céu, beijar de língua o sonho: eis o que, por estes dias, nos faz os dias. E, é essa a certeza que a cada orgasmo nos convence, há dias definidos para se ser feliz. Todos.

Pedro Chagas Freitas

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Tormento



Espírito este atormentado,
Pelas coisas que fez
E pelas palavras que não disse.

Nunca a minha loucura
Se esgueirou tanto do precipício.

Nunca a liberdade
Se revelou tão torturante.

E eu que pensava,
Que os pássaros sorriam quando partiam,
Que o povo rejubilava com a revolução,
E que o Ser Humano sempre se animava com a nova busca.

E eu que pensava,
Penso,
E nada disto sinto.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O fim do Mundo



No despertar depois de uma noite fria, solitária, negra
A claridade do sol polar embatia nos glaciares milenares.

A vida tinha passado muito poucas vezes por ali,
E eu já sentira mais miséria numa noite que em vinte anos de vida.

Encorajada pelo selvagem
E pelo doce sabor do "nunca antes feito"
Sai pela porta do meu abrigo,
Respirei fundo,
E já com o rosto embebido em cristais de gelo disse sem hesitar:
"Estou Viva".

Não era o gelo esculpido pelo tempo,
Não era o chão imaculado de pegadas humanas,
Não eram as águas intocáveis pelo vento,
A razão da minha existência aclamada.

Tudo isso me permitia mover,
Verdade.
Mas a razão não,
A razão de sobreviver não era essa.

Na incredulidade nas forças da Natureza inerte ou na Coragem,
O meu coração descansou por fim ao perceber:
O que me salvara fora o desejo de chegar ao fim do Mundo.

Eu sabia.
Sabia que era esse desejo, essa procura,
Que nos salvam sempre a nós,
Os sonhadores.

E aqui está o busílis da questão:
O desejo,
ou a crença no mesmo,
tinham desaparecido em mim.
Estava embalada pela inércia dos dias...
E foi em ti,
eterno terráqueo,
que voltei a encontrar
a possibilidade e desejo de chegada ao fim do Mundo.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Não é o medo de te perder,
Nem a tristeza de ficar só.
É a possibilidade de desgosto,
Por descrença na essência Humana.


quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Abrir os olhos



Abrir os olhos ao acordar.
Um movimento simples,
Único,
Involuntário.

Somos chamados à vida nesse instante,
Por uma qualquer essência,
Uma qualquer força,
Que nos quer deixar a novidade no olhar.

Não sou nada,
Nesse instante antes de abrir os olhos.
Mas tão somente uma alma adormecida
Incapaz de prever o que me querem dar a conhecer.

Hoje, quando abertos,
És Tu.
És Tu quem se deita ao meu lado,
Diante dos meus olhos ainda trémulos.

A essência trouxe-te.

E depois de tanto tempo,
Sem acreditar no Amor,
Eu entendi que agora tenho,
O sentido e a vontade de sorrir...

De olhos abertos.

sábado, 30 de novembro de 2013

Um excerto do Livro (sem título)

Deu um bafo profundo no cigarro e olhando a noite soltou a pergunta que seria a primeira do fim da sua vida:
   - Se te disser que nunca fui apaixonado pela vida, acreditas?
   - Não. – Respondeu ela muito séria e de olhar fixo nos olhos dele.
   - Porque não?
   - Que disparate, tu és dos tipos mais apaixonado pela vida que eu conheci até hoje... Adoras perder-te com ela, os teus olhos brilham quando ela te surpreende, o que é que é esta divagação agora?
Olhando-a com uma face dura disse:
   -Nunca poderei ser apaixonado por algo em que não acredito. Eu não acredito na vida, na sua essência. Eu não acredito que isto a que chamamos existência tenha um propósito ou uma finalidade. O Ser Humano limita-se a inventar, a perder-se, a procurar o que nunca vai encontrar – Parou por instantes e soltando o sorriso de quem conhece o poder da sua argumentação continuou – Olha a história de Deus e do Diabo, do Céu e do Inferno... tudo isso são invenções, são criações de um Ser que não suporta a ideia da solidão e a ideia da ausência de destino. Criamos, porque não suportamos a dor de não ter algo verdadeiro a que nos agarrar.
   -Ai é? – disse incrédula e com pouca paciência- E o amor? O amor também é uma invenção da ausência de tudo?
   -Médio, o amor é o chamado filho pródigo de uma família monoparental. É quase um erro de percurso percebes?
Fez que não com a cabeça e ele continuou:
   -O amor é o resultado de uma qualquer busca interior que advém da tristeza da vida não nos ser suficiente. De quando a quando, abrimos as janelas do que chamamos coração e ficamos muito tempo à espera na confusão dos temporais e dos dias solarengos. Um dia passa alguém, passa o chamado pretexto e zumbas – fazendo um gesto de quem apanha uma mosca no ar - apanhamo-lo!
Assumindo novamente a sua posição na cadeira continuou:
   -E depois é fácil, a mente fica responsável por tudo o resto. A pouco e pouco, embora o Outro com quem estamos assuma o papel de ama do nosso amor, vamos criando dedicadamente o nosso filho, nascido da corrente de ar da janela, num modelo rígido, obcecado e ao mesmo tempo desejoso de sofrer.
   -Hum... mas espera, então estás a dizer que o pretexto para o amor pode ser qualquer coisa da vida? A mesma que não existe?




sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Cruzar



No fim de uma tarde de trabalho,
Com o Sol de Lisboa e o cheiro a castanhas de Outono
Vejo-te do outro lado de uma rua que é minha todos os dias.

A vida é assim.
Encarrega-se de se fazerem cruzar por nós,
Aqueles com quem nos devemos voltar a cruzar.

O valor que damos a esse reencontro,
O que fazemos com o que vemos e sentimos,
Já está por nossa conta.

E a cada vez que ignoramos o reencontro,
A cada vez que desejamos que ele aconteça noutro lugar,
Noutro momento,
A vida tira-nos, a pouco e pouco,
As chances de nos voltarmos a cruzar.

Pouco a pouco,
Dia a dia,
Até que a memória se canse
Ou a saudade se mate. 

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

terça-feira, 15 de outubro de 2013


Saudades,

Saudades de ter tempo.
Saudades da minha solidão,
Da minha partilha,
Da minha devoção.

Saudades do meu canto,
Naquela cidade chamada Barcelona.

Fui feliz.

E não esqueço,
A calma,
A alegria,
A pausa que tive de mim
E desta vida vivida desde há 20 anos.

Saudades,
Profundas saudades.


Aqui


Em dias como este, vejo-me a não pertencer mais aqui.
A distância, o longe, a viagem, ensinam-nos que não somos de lugar nenhum,
Mas tão somente escravos das pessoas ou da nossa própria solidão.

A beleza, o ar que respiramos, o tecto de estrelas que nos abriga nas noites frias
São arquétipos de um qualquer deslumbramento que advém da forçosa necessidade de querermos ser felizes.

Não há nada nos lugares.
Não há nada no que vemos,
Para além do que temos,
Do que somos,
Do que esperamos.

Por isso, tenho as minhas dúvidas 
Quando digo que me vejo a não pertencer mais aqui.

Terei deixado eu de ter,
de Te ter?
Terei deixado eu de ser?
Terá a esperança acabado?