Frase do Dia

  • "Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão"

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Um coraçãozinho



A propósito do tema saudades, dei por mim a ter coração do tamanho de formiga.
Não sendo suficiente, a correria de visitas levou-me de coração de formiga a  coração de pulga. 
A pergunta que me faço é se estarei no caminho de ficar com um coração tão pequenino tão pequenino que a única solução será desfazer-me dele!?

Quando estamos longe é verdade que temos tendência a pensar em coisas que outrora nunca tínhamos pensado, é verdade que fazemos coisas que nunca antes tínhamos feito, mas também é verdade que sentimos por vezes na pele (ou abaixo dela) a realidade de uma forma tão intensa como nunca julgámos possível.

Estou bem onde estou, estou feliz por aqui estar e quero ficar por mais tempo. No entanto, no último mês (sobretudo) experimentei este sentir quase álgico e nanico da saudade. Não é uma saudade que me faça chorar, que me faça ficar deprimida ou estagnada, é simplesmente uma saudade que se sente mais no corpo e que me torna mais pequena... Mas mais pequena no sentido literal!

Como creio no que sinto, acabei por me ver ao espelho várias vezes nestas últimas semanas. O dito não se mostrou muito afectado com a minha redução de tamanho, mas, como aqui penso (ainda) mais, arranjei com facilidade duas explicações para a ausência de confirmações:

1. O espelho prefere mostrar o aumento das curvas filiadas à incessante ingesta de tapas e tortilhas;
2. Estou oficialmente enferma. Padeço de Síndrome de anorexia saudadítica, um conjunto de sinais e sintomas cuja etiologia é eminentemente psicogénica (que tão bem se justifica nestes novos tempos).

À parte das explicações pouco engenhosas (e pouco importantes), tenho por certo o meu diagnóstico e as consequentes repercussões no meu tamanho cardíaco. Assim, para que o meu coração não se metamorfose mais na linhagem animal, apelo ao leitor da seguinte forma:

- Se padecer da mesma doença por favor contacte-me - a medicina sempre melhorou com a troca de experiências e opiniões;
- Se pensar em matar uma formiga ou uma pulga tenha em conta que alguém poderá, com a mesma facilidade, fazer o mesmo ao seu coraçãozinho;
- Se pensar em fazer-me uma visita saiba que há relatos de aumento cardíaco nessas situações, no entanto, saiba também que a redução pós-visita pode ser fatal;
- Se nunca experimentou nada parecido e se pouco crê na veracidade destas alterações anatómicas, experimente ir ao Longe um bocadinho e ficar lá à espera - pode ficar surpreendido.

P.S. se este coração que escreve fugir da pulga, prometo dar notícias!





quinta-feira, 13 de novembro de 2014

A janela


As folhas não se movem lá fora, porque não há vento que lhes pegue. Invés disso, cai a chuva sobre a minha grande janela aberta para a montanha já nevada.

Dou-me conta no instante longo do olhar de que o tempo aqui passa e a vida aqui existe. Este é o sítio onde de facto noto que há algo em mim para além do que conhecia.
Descobri um dom? Não sei.
Sou mais feliz aqui? Não sei.

Nas corridas nocturnas saio da casa, à qual já me atrevo a chamar lar, e lanço-me às florestas virgens dos pensamentos que deixei interrompidos numa outra existência. Sou o pássaro, o sonho e a esperança.
Sou nesses momentos de deambulação da alma a personificação da aspiração que já há muito me faltava.

Será...
Da distância?
Da saudade?
Do medo?

Talvez. Talvez sejam essas as razões pelas quais estou mais perto do meu centro.
Mas o que importa? Para quê questionar?
É tempo de viver o tempo no qual me atrevi a perder-me.

sábado, 19 de abril de 2014

Em memória do grande homem e escritor que nos deixou...mais pobres de Humanidade.

"La peor forma de extrañar a alguien es estar sentado a su lado y saber que nunca lo podrás tener."

Gabriel Garcia Marquez

Histórias



Quando as histórias deixam de ter linhas por escrever, os poetas dessas escrituras tornam-se seres inanimados no espaço humano. A missão desses Seres finda e os dias terráqueos acompanham o fim desse ciclo. As manhãs já mais não têm luz e as estrelas não se esteiam no céu nocturno.

A vela do teu adormecer, apagada pelo teu sopro ausente, calou esse meu espírito de poeta. Ele que nesse sopro deixou de acreditar, de ansiar, de espectar e de esperar por qualquer coisa no destino.
Porque o ensinaste Senhor a esperar? Quando a sua espera se faz de outros humanos que não concluem, que se apagam e que se calam em nome de nada.
Aprende, que a espera torna-se este movimento inconclusivo cheio de promessas quebradas e de um vazio de amor que nos destrói por cada segundo a mais.

Por isso, quando te pedia que me contasses uma história, não era em vão. Era por isto, para que o significado de escrever, nas linhas da vida, não fosse tão lábil como essa chama que apagaste num sopro.
Quanto te pedia que me contasses uma história era porque precisava de um outro poeta junto a mim que não me deixasse findar e me acompanhasse num futuro apelidado Esperança.

domingo, 13 de abril de 2014

Alma tua


Alma tua,
Ausente, distante, nublada.

Misteriosa pelo que foi,
Revertida, fraca, amorfa
Pelo que nunca será.

Alma tua,
Que viajou sem destino,
Sem nunca se encontrar.
Perdeu-se,
Sem a força do libertar.

Alma tua,
Que não me entende,
Que lacera e deixa pó estelar.
Um pó de Vida,
Que trarará virtude
A outro universo que não o meu.

Alma tua,
Longínqua, esquecida, fugaz.
Que representa o tempo,
E tudo aquilo que não fui capaz.

Alma tua,
Que de tua nada tem.
Porque bem sabes,
A alma que digo ser tua,
É só a condição do que
me convém.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Aceitar

Aceitar:
O acto de resignação para connosco.

Aceitar é ainda a pedra lacerante do nosso orgulho, da nossa chama.
Porque nada em nós ou no que nos rodeia nos incita à aceitação.

Aceitar o erro, a perda, o desgosto.
Aquilo que nunca me poderás dar
E aquilo que não sei dar a ninguém.

Aceitar, resignar, deixar.
Para quê tanto pó levantado?



segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Há dias definidos

Este senhor descreve tudo e tão bem...


Dias de chocolate e sexo. Dias de doces e suores. Dias a dois, na solidão cheia de um mundo sem par. E tudo se resume ao prazer. Todos os suores merecem amar. Todas as bocas sabem o que é a felicidade. Todos os Homens sabem o que é a felicidade - mas só alguns têm a coragem de a exigir. Em ti, por detrás do pano do beijo, por detrás da força do abraço, por detrás do barulho eterno de um gemido, há toda a coragem de nada mais haver senão tudo. Passar as mãos pelo céu, beijar de língua o sonho: eis o que, por estes dias, nos faz os dias. E, é essa a certeza que a cada orgasmo nos convence, há dias definidos para se ser feliz. Todos.

Pedro Chagas Freitas

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Tormento



Espírito este atormentado,
Pelas coisas que fez
E pelas palavras que não disse.

Nunca a minha loucura
Se esgueirou tanto do precipício.

Nunca a liberdade
Se revelou tão torturante.

E eu que pensava,
Que os pássaros sorriam quando partiam,
Que o povo rejubilava com a revolução,
E que o Ser Humano sempre se animava com a nova busca.

E eu que pensava,
Penso,
E nada disto sinto.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O fim do Mundo



No despertar depois de uma noite fria, solitária, negra
A claridade do sol polar embatia nos glaciares milenares.

A vida tinha passado muito poucas vezes por ali,
E eu já sentira mais miséria numa noite que em vinte anos de vida.

Encorajada pelo selvagem
E pelo doce sabor do "nunca antes feito"
Sai pela porta do meu abrigo,
Respirei fundo,
E já com o rosto embebido em cristais de gelo disse sem hesitar:
"Estou Viva".

Não era o gelo esculpido pelo tempo,
Não era o chão imaculado de pegadas humanas,
Não eram as águas intocáveis pelo vento,
A razão da minha existência aclamada.

Tudo isso me permitia mover,
Verdade.
Mas a razão não,
A razão de sobreviver não era essa.

Na incredulidade nas forças da Natureza inerte ou na Coragem,
O meu coração descansou por fim ao perceber:
O que me salvara fora o desejo de chegar ao fim do Mundo.

Eu sabia.
Sabia que era esse desejo, essa procura,
Que nos salvam sempre a nós,
Os sonhadores.

E aqui está o busílis da questão:
O desejo,
ou a crença no mesmo,
tinham desaparecido em mim.
Estava embalada pela inércia dos dias...
E foi em ti,
eterno terráqueo,
que voltei a encontrar
a possibilidade e desejo de chegada ao fim do Mundo.