Frase do Dia

  • "Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão"

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

O fenómeno


O fenómeno do "Continuar a Gostar".

É surpreendente a capacidade que o Homem tem para continuar a Gostar de algo ou de alguém. Não me deixa de impressionar, apesar da maioria tomar como garantido, a forma como o coração nos orienta. E o sentido é único, mesmo estando cada um de nós sujeito a um rodopio de estímulos diários que poderiam facilmente promover a alteração de rota.

A verdade é que as mentes mais racionais explicam este fenómeno à luz de um trabalho diário, incessante e silenciosamente obsessivo. No entanto, tanto a experiência como a observação me têm mostrado que parte deste, advém de elementos exteriores independentes do nosso trabalho, dedicação ou cuidado. 
Injustos, inglórios e demasiado imprevisíveis. São os apelidos que geralmente atribuimos a esses elementos. Concordo. Muitas vezes concordo. Mas neste campo específico, da Arte de Gostar, a verdade é que o encanto do que está por fora do domínio da vontade se sobrevaloriza. Chega a ser mágico o inexplicável que é, dia após dia, experiência após experiência, Continuarmos a Gostar como no primeiro dia em que o fenómeno "rebentou".

Mais do que continuar, na verdadeira acessão da palavra, como quando perseguimos uma linha recta monocórdica, o fenómeno do "Continuar" exerce-se numa sucessão de picos. 
Sentimos na pele dos dias os Altos e Baixos inerentes ao Tempo que inevitavelmente nos toca, mas quando nos olhamos numa perspectiva extracorpórea o que se vislumbra é uma linha activa, que brilhantemente se desenvolve no infinito. 

Que continuemos a deixar e a saber "Continuar a Gostar". 
Mas que seja claro (porque nem sempre se pode fugir ao racional) que os referidos Picos que reluzem a recta são como as transmissões de um electrocardiograma. Inteiramente dependentes de um impulso eléctrico transmitido entre dois pólos. 


quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Caminhos de ferro


Os caminhos de ferro seguem firmes pelas paisagens infinitas de perder de vista. O que vislumbram é tudo o que a vida alegoricamente pode dar: a respiração nos prados verdes, a liberdade nos riachos alagados de cristais, o amor nos casais apaixonados, a perda e o terror nas lágrimas derramadas entre faces de vultos intocáveis.

Passam. Rectos, estóicos, seguros e salvos por uma falsa imunidade carente de exposição aos antigénios vitais.
Contínuo movimento. Paragens obrigatórias. Tudo como previsto nos relatórios de circulação prescritos por entidades alheias.

Mas até eles, espiritualmente amorfos, têm os seus pequenos desvios.
Desvios esses que os sustentam nas pequenas alterações térmicas, subjacentes às variações a que nenhum material, mais ou menos vivo, pode fugir.
No mínimo desvio, que nada mais cumpre que as leis da termodinâmica, eis que se impede o descarrilamento.

Imaginem-se agora os irrequietos de espírito que seguem nos seus próprios veículos.

De que precisarão mais para além das omnipresentes leis da física?
Mais certamente, sempre mais.
E por isso vivem e não somente vislumbram.





segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Interregno

Maldito interregno este que me ocupa e dissimula, que corre como um veneno insólito e entranhado no jogo confiante de que um antídoto eficaz tardará em chegar.

Interregno por ser o período que decorre entre o momento em que me conheci e o futuro que não sabe até onde se irá perder.
Maldito, porque habita corrosivamente nesta nuvem que a nenhum corpo, razão ou destino pertence.

As lutas incessantes preenchem este hiato e trazem-me por vezes ao rosto gargalhadas descabidas e desorientadas, típicas de quem teme e de quem se vê, já em idade adulta, a espreitar a porta da saída do armário.

Sinto o ridículo. 

Tantas e tantas vezes com tantas certezas. Tantos sonhos. Tantas vontades. E de repente uma sensação de vazio incontrolável, uma nebulosidade que não passa com o despertar e que não desaparece com um copo de vinho demasiado cheio.

Onde estou?

Será que a Puta da vida armou-se agora em senhora e quer ser tratada pelo nome? 

É doloroso. Mais ainda, para quem pensa, repensa e volta a cair no erro de pensar.
Conto os dias para o terminar desta tortura que até do sono se alimenta. 

Que desgarro incomensurável de mim.

Que é feito de ti, espírito de alento e desejo?! 
Volta, porque não há maior saudade que aquela que nutrimos por nós mesmos.