De um Terreno Celeste

De passo a passo, subo por fim à tua janela pela porta de entrada.

Mal sinto os azulejos frios que escondem a tua história, o cheiro de um mofo confortável, familiar, de gerações e gerações de amor arrepiam os meus sentidos.

De pé ante pé, com o meu corpo a deambular pela tua infinita memória vivã, descubro cada recanto daquela casa a que chamas lar.

Dos livros tirei o pó e fiquei com as dedicatórias, com as gargalhadas e os entulhos das letras. Do chão de madeira tirei as pegadas e reconstruo na mente o teu trajecto de pequeno navegador.

Ai. Daquelas fotografias tirava as almas, mas delas só sai a cor, o sorriso, a mão calejada do avô e o sorriso terno da avó.

Infinito foi, infinito é sentir o cheiro da horta, a canção da terra. Aquele pedaço de gentes enterrado fez-se compor a melhor melodia de um trio amigo. No júbilo de reencontrarmos as origens, fortalecemos as nossas raízes e começámos a plantar a nossa própria terra.

O fogo e as gargalhadas daquela noite cessam quase por fim às dúvidas que tinha em amar-vos.

Mãos à obra.

Há falta de culturas destas!

Nada será

Não há nada

Só nós.

Quem nós

Quem nos quis

Ou ainda quer

Não te quero

Não me queres

Não nos queremos

Partiste

Parti

Frágil com seguro

Partiste forte e inseguro

Fui

E tu nunca foste

Eu sou ninguém

Tu é eu sem querer ser ninguém

Sem ser alguém de ninguém

Por isso

Não sou

Não és

Isto nem existe

Não é.

Não foi.

Não terá sido.

Nem será.

Partilha

Com a necessidade da partilha deixo-te rastos de um dia qualquer que foi meu.

"No respirar vai o cheiro, a alma, vãos os rios vadios e os ventos desnorteados. Vai a loucura e vão as gargalhadas.

Vai esta doce maneira de viver.

Vãos os livros, as estórias e o Continente.

Vai a brisa e a Natureza, vão os momentos e os micromomentos. Vão os amigos.

No expiro, vai aquilo a que não aspiro. Vão as tristezas, os medos, vão as coisas menos boas.

No corpo lívido e limpo, ficam só vocês, aquelas únicas coisas, de que tristemente me consigo esquecer às vezes.

Fica só assim, o fumo da essência dessas coisas tão boas, chamadas As Melhores da Vida"

Passou-se bem, só de relembrar.

De tanto tempo

Perder-te no deslizar dos movimentos é triste, a garganta esmaga-se por isso a cada segundo e da boca saem silenciosas palavras que nunca te disse.

De tanta a distância, navegas já noutros oceanos, os faróis que nos guiavam, já não te acompanham nas duras viagens e agora que descobres outros, por egoísmo meu, penso, tenho medo que encontres um com a luz tão ou mais forte do que aquele que construímos um dia na praia.

Sinto a tua falta, da tua sorrateira presença na vida, da cumplicidade que espero existir, sinto falta do teu abraço.

O que me faz ainda acreditar, é que mesmo no limiar do longe e dos oceanos defuntos, ainda existe um mar que nos liga.

Tive e tenho saudades tuas