Frase do Dia

  • "Tudo o que chega, chega sempre por alguma razão"

terça-feira, 30 de maio de 2023

Do outro lado da montanha


Aos vizinhos quero-os do outro lado da montanha. 

Que venham ao meu encontro quando os chamo, quando quero, se quiser. 
Para um almoço animado, um copo de tinto e eventualmente uma conversa transcendente que nos traga a sensação de que gostamos de viver.
Os vizinhos que venham para se sentirem bem, desejados num momento de partilha, sedentos da gargalhada e embriaguez fáceis. 

No tempo morto: os vizinhos nas suas casas. Eu na minha. 
Nos tempos escolhidos: encontros ocasionais, opcionais, leves. 

Que as tardes de acolhimento sejam só bem passadas. Nos tragam alegrias, histórias para contar e até sonhos ou projectos para nos reencontrarmos em viagens alucinantes mas breves.

O que quero são vizinhos de ocasião, que não me penetrem a alma mas tão somente o estado de espírito.
Quero boas companhias que não me conheçam de verdade.
Quero diálogos entusiastas, sem promessas duradouras.
Quero felicidade em estado puro: passageira.

Não quero o compromisso, a entrega, o conhecimento profundo ou os juramentos eternos.
Não preciso do perdão ou de perdoar.
Não preciso de fazer sofrer nem do sofrimento.
Não preciso de saber o que os move ou paralisa.
Não precisam de saber os meus medos e anseios.
Não farão falta as saudades, as lágrimas ou a desilusão.

Assim serão eternos, os vizinhos do outro lado da montanha.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Num instante


Num instante tudo muda.
Fica escuro.

A tua presença vira ausência.

O que era o dia, a rotina, o toque, desaparece como a leveza do que nunca existiu. 


No negrume, vem uma nuvem que me adormece os sentimentos e a energia.

Fico só. 

Fico só com aquilo que existe para além de ti-aquilo que pensava ser tanto.


Apercebo-me que preencheste muitos dos espaços que nunca deixara ninguém vislumbrar ou ocupar.

Entraste de rompante e criaste raízes profundas sem pedir, com a naturalidade de quem prometeu, sem palavras, ficar.


Hoje, neste instante, saíste sem deixar recado. 

Deixaste-me no silêncio.

No meu íntimo, sempre soube que este dia ia chegar, porque quem como eu nunca abre as portas a ninguém, sabe que nada do que nasce pode durar para sempre. 

É esta a beleza da efemeridade.


No final, julgo estar a sorrir, porque partiste para ser feliz. 

E eu, que fui apenas o lugar de um tempo bem passado, dissipo-me do que fomos e encontro novos horizontes.


É esta a magia do instante: quando a nuvem passa, há muito mais para além do que se via.